A primeira vez que transcendi

Leonardo Castelo Branco
2 min readJun 19, 2023
Imagem gerada por IA

Começo sem saber por onde começar. Escrever sem rumo é suficiente. É como respirar depois de um longo período submerso. Não sei como preencher este documento, mas sei que preciso fazê-lo para tirar do corpo o bolor existencial. Estou exausto. Todos nós estamos.

Passo alguns minutos em silêncio, observando o espaço em branco. É o tudo que, paradoxalmente, é também o nada. Pensamentos, ideias e lembranças duelam. A recordação mais marcante prevalece, aquela que me desperta nos momentos de cansaço: a primeira vez que transcendi.

Era uma manhã fria de sábado. Deitei-me no chão, posicionando meu corpo na única mancha de sol que adentrava a sala do meu apartamento. O som do piano de Philip Glass era onipresente como o ar. Fechei os olhos, imerso no calor, completamente preenchido pelo sol e pelo som.

Pelos próximos cinco ou dez minutos não havia nada além de nada com ressoadas leves de piano. Eu estava à deriva em um mar de leveza. Uma carga espiritual percorria meu corpo. Sensações pulsantes em regiões desconhecidas. Descobri ali um guardião invisível que me acompanha e ilumina meu interior.

Retornei à realidade quando a música diminuiu e o clamor cotidiano de buzinas e vozes anônimas reassumiu o controle. Fiquei ali, semiconsciente, como um cachorro farejando o vento na janela de um carro em alta velocidade. Tudo parecia estimulante e pavimentado de novos significados.

Mais do que nunca, eu era real, eu existia, e, naquele momento, existia mais dentro de mim do que no mundo exterior. Sim, eu existia. Eu existo. Parece que tudo o que vivi até a primeira vez que transcendi foi para chegar aquele encerramento aparentemente banal.

E agora, chego ao final deste texto com a certeza de que um documento em branco pode ser um mapa. Um mapa de transcendência que me guia em direção ao poder revolucionário das simples conclusões.

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